No passado dia 15 de outubro, assinalou-se o Dia Mundial da Bengala Branca, símbolo da autonomia e independência das pessoas com deficiência visual. Em Vila Real, a delegação da Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal (ACAPAO), através do Centro de Atendimento, Acompanhamento e Reabilitação de Pessoas com Deficiência (CAARPD), promove o uso da Bengala Branca junto dos utentes, um instrumento que facilita a autonomia, mobilidade e inclusão na sociedade.

Carina Ferreira, diretora-técnica da Delegação de Vila Real e Bragança da ACAPO, sublinhou, em entrevista à UFM, a propósito desta efeméride, que a Bengala Branca “representa a capacidade de as pessoas cegas ou com baixa visão se deslocarem a diferentes locais sem estarem dependentes de terceiros”.

“A bengala tem três importantes funções: a capacidade de explorar o espaço e fazê-lo de forma segura; a capacidade de proteger a pessoa com deficiência visual, porque funciona como uma extensão do próprio braço, para detetar obstáculos e desviar-se deles; e, por último, para sinalizar, para chamar a atenção de quem se desloca de carro, por exemplo. Por isso, não só representa a autonomia da pessoa cega, permitindo-a realizar o seu dia a dia de forma autónoma e segura, como também consciencializa o público em geral”, informou.

Duarte Sousa é um utilizador regular da Bengala Branca. Este jovem, com deficiência visual, é técnico de informática na ACAPO e considera que as cidades, de uma forma geral, ainda são um desafio para quem se desloca de bengala na mão. “As cidades continuam, ainda, com muitos obstáculos. Sejam passeios estreitos, desnivelados, com piso irregular, ou postes no meio de passeios, tudo isso são pequenos obstáculos que, para quem vê, não faz grande diferença, mas para uma pessoa cega faz toda a diferença”, referiu, admitindo que começa a assistir-se a alguma mudança na sociedade: “as coisas têm vindo a mudar um bocadinho. Não só na mentalidade das pessoas, mas também nos acessos físicos e na mobilidade urbana. Encontramos pisos táteis ou passadeiras rebaixadas, por exemplo, que nos facilitam bastante a circulação”, acrescentou.

Há pessoas com deficiência visual que continuam a recusar a Bengala Branca”

A Bengala Branca é, para Paulo Outeiro, de Vila Real, “um grande conforto”. “Ajuda-me imenso no meu dia a dia, enquanto circulo pela cidade, e pode ajudar-me a evitar uma queda. Ando sempre com ela”, contou o utente, com baixa visão.

Os desafios nas cidades são imensos, no que toca à integração das pessoas cegas, e Paulo Outeiro desafia os responsáveis a pensar também nas pessoas que não veem. “Precisamos de cores diferentes nos edifícios, de eliminar obstáculos desnecessários, degraus que não fazem falta nenhuma ou que podiam ter uma cor diferente para estarem sinalizados. Não é só por causa dos cegos. Há muita gente que vê, mas que vê mal. As pessoas, quando projetam os edifícios, só pensam naqueles que veem”, continuou.

Se, por um lado, deve haver um esforço das autoridades locais em facilitar a circulação, por outro lado ainda persistem os estigmas em relação ao uso da Bengala Branca por parte das pessoas com deficiência visual. “Para vermos a mudança na sociedade, ela tem que acontecer primeiro nas próprias pessoas. Ainda há um estigma muito grande associado à Bengala Branca. Há pessoas com deficiência visual que continuam a recusar a Bengala Branca e a continuar na dependência de familiares. É um símbolo de autonomia, de capacidade, de orgulho, e nunca pode ser visto de uma forma negativa”, sublinhou Carina Ferreira.
Por fim, a responsável enalteceu o esforço das autoridades locais em prol da acessibilidade, mas alertou que as partes interessadas, que são as próprias pessoas com incapacidade, devem ser sempre consultadas: “sem perguntar o que elas necessitam, o que pode ser feito para facilitar o seu dia a dia, acabamos por investir muito dinheiro, muitas vezes em vão, sem ir ao encontro das necessidades dessas pessoas”.

De referir que a ACAPO é uma instituição de autorrepresentação, ou seja, os órgãos sociais são constituídos por pessoas com deficiência visual, que defende os seus direitos e trabalha junto da comunidade no sentido de conseguir a sua plena inclusão, numa sociedade livre de barreiras.