Por: Anabela Quelhas
Verifiquei que em qualquer sítio onde estejam crianças, estas reflectem de imediato a educação que têm e qual o perfil dos pais.
Há crianças fabulosas, simpáticas, atenciosas, que conhecem as palavras mágicas – obrigada, peço desculpa, se faz favor, bom dia, adeus, com licença – e que as utilizam em qualquer situação e em qualquer país. Há outras, onde entram, provocam desconforto imediato a quem está por perto, acompanhadas por pais absolutamente desorganizados e perdidos. Nos restaurantes, em vez de lhe indicarem o local onde se devem sentar, perguntam:
– Meu amor onde te queres sentar? – enquanto os pais e eventualmente os avós aguardam pacientemente a sua decisão.
Segue-se a fase da inquietação e da birrinha por tudo e por nada e só se calam quando lhe passam um telemóvel ou um tablet para as mãos. O digital parece desempenhar o papel de anestésico com efeito imediato.
Basta isto, para percebermos, quem manda lá em casa e como se educa uma criança. Estes pais não dão oportunidade a que os filhos olhem para a comida, olhem para os pais e muito menos para quem está à sua volta. Evitam qualquer frustração ou vazio na vida dos seus queridos petizes.
Um dia encontrei um casal conhecido que passeava o seu bebé com menos de um ano, no carrinho de passeio e notei que, este já segurava um telemóvel. Perguntei porque lhe permitiam usar o telemóvel. Responderam que se lhe tirassem o telemóvel ele chorava. Como tenho alguma confiança com o casal, atrevi-me a informá-los que as crianças precisam de chorar, de serem contrariadas e sobretudo é função dos pais dar-lhes espaço para a frustração e os espaços de ócio sem fazer nada, para que estas descubram como ocupar tempo e saber lidar com a frustração e os nãos da vida; e quando são muito pequenos como era o caso, é essencial que os pais sejam criativos, lhes ensinem a ver o mundo sem ser através do telemóvel. Devem pegar-lhes ao colo, cantar, mostrar o que os rodeia, fazer com eles brincadeiras básicas que os envolva como participantes, que ampliem os afetos e simultaneamente estabeleçam limites à sua acção.
Até aos seis anos os pais têm a responsabilidade de “apresentar” o mundo aos seus filhos, proporcionando-lhes experiências variadas e não o estão a fazer. Não é preciso carregá-los, ainda recém-nascidos, para férias na praia, nem levá-los para um Resort nas Caraíbas, porque as férias converter-se-ão numa canseira constante. Pode ser no quintal, na sala lá de casa, em casa dos avós… mostrem aí a vossa competência como pais.
Informei que sempre existiram crianças que choram, mesmo antes dos telemóveis. As crianças dos telemóveis transformar-se-ão em crianças insuportáveis no futuro, sem socialização, neuróticas, agressivas e mal-educadas. Elucidei que quando os pais afirmam orgulhosamente que o seu filho, tão pequenino, já sabe usar os suportes digitais, como se estivessem a partilhar a inteligência do filho sobredotado, é um péssimo sinal, nem adivinham os grandes problemas que os espera no futuro, e o certificado de incompetência que estão a passar a si próprios.
Volto mais uma vez a este assunto.
Investiguem sobre os malefícios dos suportes digitais utilizados por crianças e jovens em formação. Perceberão que estão a reduzir o mundo, ao ser que mais amam.
É chato aturar um filho a chorar? É!
É estafante dar-lhes atenção constante? É!
É doloroso impor limites? É!
É esgotante andar com sono em atraso, multi tarefas para fazer e, mesmo assim, arranjar tempo para interagir com o filho com um sorriso nos lábios? É!
É uma seca trocar um jogo do nosso clube de futebol, por um jogo idiota de colocar peças umas em cima das outras, para depois tirá-las pela mesma ordem e recomeçar tudo de novo? É!
É frustrante, trocar a discoteca, a noite com as cervejolas, as caipirinhas e o trecolareco com os amigos(as), por uma noite a mimar o filho e a recontar pela milésima vez a história da carochinha? É!
É, e é assim que tem que ser, porque ser pai e mãe tem destas coisas e o melhor é aceitar e praticar, porque dói menos. Não pense em avós, babysitters, amas, creches, academias, escolas e ATLs, porque não é a mesma coisa; os pais são insubstituíveis e são os reais responsáveis pelos filhos que puseram neste mundo. Telemóveis? nunca antes dos 6 anos, e depois, em doses reduzidas, por favor.